“Vai passar”
“A pandemia do coronavírus vai passar!” Temos ouvido muito essa frase, dita por vários atores sociais. No entanto, precisamos admitir que a pandemia está demorando mais do que nós imaginávamos para passar. Estamos ficando ansiosos, impacientes e irritados. Ainda não vislumbramos uma data de retorno das atividades presenciais. Mais do que isso, estamos nos perguntando: “Como vai ser esse retorno?”
Em 1985, no Acre, Alto Rio Purus, fui com um grupo de aproximadamente 15 indígenas, do povo Kulina, “Madijá”, na língua deles, para extrair o látex da seringueira nativa, matéria prima para fazer a borracha que também usamos em nossos pneus. Subimos um trecho do rio de canoa. Depois, adentramos na mata e caminhamos durante dois dias, até chegarmos naquela colocação de seringa, como se diz na região. Ficamos perto de quinze dias por lá. Estávamos cercados por uma mata alta e densa. Nosso horizonte era curto. Era possível ver o céu pela pequena clareira aberta pelo nosso acampamento. Estávamos afastados de tudo e de todos.
No começo deu pra aguentar, pois tudo era novidade. Conforme o tempo passava, eu ficava cada vez mais angustiado. Precisava de perspectiva, de horizonte. Já não aguentava mais olhar para aquele urubu rei, que sempre vinha pousar naquele mesmo galho da árvore que ficava em frente ao acampamento. Ali, o céu parecia pequeno demais. Era preciso ter nascido e vivido numa aldeia, para poder dar conta daquela situação.
Depois daqueles quinze dias de afastamento geográfico e social, começamos a viagem de retorno à aldeia, carregados de látex. Foram outros dois dias, a pé, pela mata, até chegarmos às margens do Rio Purus. O céu ficou maior, o horizonte mais amplo, e eu mais calmo, menos ansioso. Aproveitei cada curva de rio que revelava margens mais largas e retas maiores. Não apenas o céu parecia maior, mas também o sol mais intenso, com o auxílio do espelho d’água.
No momento atual, estamos precisando de perspectivas, de horizontes, para as nossas atividades. Estamos ansiosos. Queremos voltar para as ruas, praças e igrejas. E vamos voltar, mesmo que demore mais um pouco. Não estamos acostumados a essa situação de distanciamento social.
Precisamos aprender a ter a paciência de Jó, que perdeu tudo na vida, mas não desistiu dela. Ou a dos sonhadores, que sabem que os horizontes são maiores do que a nossa vista pode alcançar, e se alargam cada vez que damos um passo na sua direção. Cada curva do rio revela novos encantos. Enquanto aguardamos o retorno das atividades, sigamos o conselho do apóstolo Paulo: “Não nos cansemos de fazer o bem. Pois, se não desanimarmos, chegará o tempo certo em que faremos a colheita.” (Gálatas 6.9)
Pastor Luis Henrique Sievers
Maio de 2020